Foto: Daniel Augusto Jr./Agência Corinthians
Era para ser inesquecível desde o amanhecer e assim foi. Naquele dia 4 de julho de 2012, saí cedo de casa, coisa de 10h30, para o jogo que ocorreria só às 21h50. Morava ali no meio da Vila Formosa, bairro no qual nasci e fui criado, no entanto um pouco distante da área em que vivi nos primeiros 20 anos de vida. À época, estávamos residindo em uma casa grande e antiga, situada à Rua Mandioré, não me lembro bem o número, acho que era 449. Bem concentrado, pois eu entraria em campo nas arquibancadas, subi caminhando para a Avenida Doutor Eduardo Cotching e logo embarquei em um ônibus elétrico, sentido Praça da Sé.
Fiz um traçado diferente da tradicional ida ao Pacaembu. Ao invés de pegar o também trólebus Cardoso de Almeida e descer a um quarteirão do estádio, ou entrar no convencional Parque da Lapa para descer na Avenida São João e pegar outro até a Praça Charles Miller (tudo isso graças às saudosas quatro viagens do Bilhete Único, implantado em São Paulo pela então prefeita Marta Suplicy, eleita pelo PT), peguei o Gentil de Moura. Meu destino final era encontrar a Janna Couto, para prepararmos o esquenta da não menos saudosa Brigada Miguel Battaglia. As cervejas nos isopores com gelo, as cachaças e outras coisas mais preparadas com carinho para receber nossa coletividade diante do local do jogo. Por falar em Janna, ela que esteve presente desde a campanha do quinto título brasileiro de 2011, ainda não sabia se assistiria à partida*.
Chegamos por lá pelas 16h e já encontramos algumas amigas e amigos. Lembro do Diego Grisolia, um menino argentino que hoje é médico, fazia um programa conosco na Rádio Coringão e conseguiu ingresso para ir à decisão. Outros iam chegando e, antes de anoitecer, nossa concentração tradicional emanava confiança. As mandingas, as orações, os cânticos, os abraços, o Corinthians. Outra característica marcante dessa data celebrada ontem é a confiança. Não lembro de nenhuma corinthiana ou corinthiano em desalinho, imaginando a possibilidade de derrota. Estávamos inteiros, cientes da nossa missão, do que representávamos. Não éramos, não fomos e nem somos melhores por presenciarmos 90 dos mais especiais minutos da história alvinegra. No entanto, a responsabilidade era grande. Tínhamos que jogar muito, como fazemos quase sempre na arquibancada, mas precisávamos de algo mais. E havia. Parecia que todos conseguiram levar consigo a força necessária para derrotar o último adversário daquela epopeia.
Foto: Arquivo Pessoal/Alex Dinarte
Quando enfim a bola rolou para Corinthians x Boca Juniors-ARG, a ansiedade passou e se transformou em futebol. O Timão de Tite não tinha nada de mais na questão técnica, mas conseguia ter, de um a dez, a nota sete e meio de todos os jogadores do elenco. O equilíbrio tático e as escolhas corretas dos atletas em campo faziam o diferencial. Alguns craques como Chicão, Paulinho e Danilo davam segurança, ritmo e fluidez ao time. A liderança de Alessandro, a experiência vencedora de Fábio Santos, a vontade de Leandro Castan, a força de Ralf, a precisão de Alex e a disposição de Jorge Henrique completavam quando o poder decisivo de Cássio e Emerson, por ventura, não aparecesse. O coletivo era rigorosamente intenso. Já o adversário, ou melhor, os adversários, penavam. O gol do reserva Romarinho, no primeiro toque na bola como jogador do Corinthians, abalou os argentinos no empate em 1 x 1 naquele jogo de ida. Na arquibancada, a Fiel permanecia confiante e remando, enquanto no gramado a construção do resultado era questão de tempo. Quando Danilo fez das genialidades dele, após ganhar de nuca do zagueiro xeneize e dar de calcanhar para Emerson abrir o marcador, a explosão ecoou e a tal confiança foi traduzida em mais certeza. Depois da inteligência do nosso camisa 11, predestinado, ao interceptar um passe no meio-campo e avançar para liquidar a fatura da conquista invicta da Libertadores da América, era só entregar o troféu devidamente grafado com o nome do Sport Club Corinthians Paulista, finalmente, entre os clubes campeões.
O orgulho pela campanha e principalmente pela vitória foi muito maior que o alivio, mas seria injusto e inverídico dizer que não havia um peso. Depois da partida, a sensação de dever cumprido era tão grande que pouco investi na comemoração. Entre uma cerveja e outra ainda defronte ao monumental Paulo Machado de Carvalho, perdi as forças e não continuei na festa, decidi voltar para casa. A vitória naquela batalha foi a real celebração. No caminho, apenas o sorriso da satisfação e uma gratidão enorme a todos que fizeram parte dessa trajetória que, para este colunista, começou lá no início dos anos 1990. Saber que nos fora dada a responsabilidade de representar todos que viveram o Corinthians desde 1910 foi incomparável.
Obrigado por nos escolher, Corinthians!
*Juntou-se com um grande amigo, o amuleto Osnir Beloli, após ele ceder a sonhada entrada dele ao filho Pedro. Tanto Janna como Osnir foram para a porta do Pacaembu sem ingresso e fizeram o impossível para entrar. Desde o início do jogo, percebíamos que a confusão estava armada no lado de fora com bombas e tudo mais. Quando olho no relógio, 22 do primeiro tempo. Dou uma olhada para o lado esquerdo na diagonal para baixo e vejo uma galera invadindo pelo portão principal. Na sequência, percebo dois ao lado direito da entrada, pulando abraçados já dentro do estádio, ali quase em frente ao banheiro masculino. Eles conseguiram invadir no “cavalo doido”. Mais um ingrediente para tornar aquela noite especial em que o Corinthians não perderia. E que hoje estejamos inspirados, com e pelo espírito corinthianista vencedor de 2012. Vai, Corinthians!
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